Desilusão

Formalmente, a palavra "Desilusão" significa uma decepção ou desencantamento decorrente de uma experiência negativa profunda; é o acto de desiludir-se, desenganar-se, o que pressupõe que nos enganamos sobre algo ou alguém, que num certo momento, acreditamos. Oscar Wilde disse e muito bem que "no amor todos os caminhos acabam de forma igual - desilusão." Com o passar do tempo isso é cada vez mais claro para mim. A desilusão em que se tornou a minha vida não se deve somente a uma pessoa, mas deve-se principalmente a essa pessoa. Com o resto posso eu bem, acho eu.
Iludi-me... iludi-me quando pensei que podia ser alguém que não sou, iludi-me quando quis ser de uma maneira que não sou, iludi-me quando achei que tudo tinha solução, iludi-me quando quis negar o que sentia, iludi-me ao ter esperança que um dia ia ser feliz. A ilusão faz parte; com ela podemos imaginar tanta coisa. Nela, somos falsamente felizes. Eu fui falsamente feliz, na ilusão. Durou pouco. Ao perceber que o rumo que eu estava a seguir não era aquele que eu tinha em mente, comecei a decepcionar-me. Quando isso acontece cabe-nos a nós voltar para trás e encontrar um caminho melhor. Por que é que eu não voltei para trás quando pude? Sinceramente não sei. Um objecto inanimado não sou. Eu tenho vontades próprias como toda a gente. Talvez o meu problema tenha sido a falta de iniciativa ou determinação. Fui comodista. Deixei andar. E as consequências estão aí. E atrás delas veio a desilusão. Meti-me num curso para o qual acho cada vez mais que não tenho vocação, tive de lidar inúmeras vezes com a maldade e o preconceito das pessoas, decepcionei-me com a minha mãe a tal ponto de não confiar mais na sua pessoa e de nem sequer a suportar, tenho amigos que nunca sequer perceberam o meu estado e tão pouco se importaram com ele, apaixonei-me por uma pessoa que nem sequer se pôs 1 segundo no meu lugar para ver como isto é. A minha vida resume-se a isto. Diz-se que o que não nos mata, torna-nos mais forte. Mas eu não sei se hoje sou uma pessoa mais forte do que era há dois anos atrás. Diferente com certeza serei.
Durante a semana, de manhã, custa-me imenso ter de me levantar e preparar-me para mais um dia. Custa-me mesmo. A força é quase inexistente para enfrentar o mundo lá fora. A depressão deixa as pessoas assim, sem forças e desmotivadas. O esforço que eu faço para ir e estar nas aulas é incalculável. Sinto-me alienado e à medida que me empenho na faculdade vou piorando psicologicamente.
As coisas simplesmente não estão a bater certo. Em mim alguma coisa não está a funcionar correctamente. No último sábado à noite, lá estava eu a jantar sozinho pela milésima vez. A solidão por vezes é um refúgio, mas outras vezes é um martírio. Chorei enquanto comia e via televisão. Ali, naquele momento, não precisava de usar truques nem de disfarçar nada. Estava só eu. Podia ser eu, sem reservas. Passado uns momentos toca o telemóvel e com ele vinha um convite para mais uma saída à noite. E lá fui eu fingir que estava tudo bem e que era uma pessoa super feliz. A pessoa que eu sou socialmente na realidade não existe. Esta semana, esta quinta-feira, discuti mais uma vez com a minha mãe. Não há volta a dar. Acabou. Assim que eu puder desprender-me financeiramente acabou definitivamente. Não entendo por que é que as pessoas odeiam-me tanto. Não encontro o motivo. Por que raio temos de ser todos iguais? Porquê? Se eu nasci transgénero não foi obviamente uma escolha minha. Aconteceu. Foi a Natureza que assim o determinou. E eu não vou lutar contra mim. Já o fiz e sofri muito. Não vou ser o que não sou. Não vou, não é porque não quero, não vou porque não consigo. Não sou igual a ninguém. Eu sou eu. Sou assim e serei sempre assim. E não vou conseguir agradar a todos, Hugo incluído. As pessoas antes de criticarem e gozarem deveriam colocar-se na mesma situação e pensar como seria. Ninguém conseguirá controlar-me. Eu não sou uma marioneta. Qualquer pessoa que me queira fazer de marioneta pode esquecer a minha amizade.
O Hugo é incontornável. É injusto pôr-lhe as culpas em cima, mas também é tão injusto o meu estado. Há uma coisa em que tenho pensado bastante ultimamente. Uma vez um colega meu disse-me (relativamente ao Hugo): "Ah eu sei quem é. Ele tem um ar arrogante, não?". Disse-me também que o Hugo não podia corresponder-me. Eu esqueci aquilo, mas agora não me sai da cabeça. Eu não consigo conceber a ideia que aquele rapaz de quem eu gosto é má pessoa. Não consigo. Mesmo sabendo que ele me tenha tratado com grande desprezo. Eu próprio aparento ser uma pessoa arrogante, fútil, irritante. Mas no meu caso eu uso essa imagem como defesa. Não posso mostrar a parte fraca e deixar os outros pisarem-me como tentam sempre.
Estes tempos são os piores de sempre. Chorar não vai resolver absolutamente nada, mas tem sido um conforto. Não quero baixar os braços e desistir de viver. Mas está complicado. Sinto-me à deriva no mar à espera que me salvem. A pessoa que o podia fazer não quer. E eu sei que ele sabe que eu estou assim. Ele sabe! Até lá, tenho de continuar a fingir que sou forte.

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