Em pedaços / 1000 estrelas

No final da tarde do feriado de 25 de Abril, fui para o mesmo sítio em que estive depois de ter contado ao Hugo o que sentia por ele, em Maio do ano passado. Estava a observar o pôr do sol. Foi como se estivesse a reviver aquele momento. E acho que nunca o descrevi aqui. Maio de 2010, assim que descubro o perfil dele na rede social a minha reacção imediata foi mesmo não ter reacção, paralisei, gelei. Pouco depois comecei a tremer por todos os lados, saí do quarto e corri para o tal sítio. Chorei muito naquele final de tarde, fiquei a ver o anoitecer até me acalmar. Passado quase um ano, pouca coisa mudou. E para mim é quase inacreditável eu estar há tanto tempo agarrado a uma pessoa com quem não partilhei quaisquer momentos. E com toda a minha agonia afirmo que só sei que ele me atrai e que gosto dele. Não há explicação, não há motivos. Só sei que assim é. Quis tanto lutar contra isto ao ponto de me odiar e de odiar a minha maneira de ser. Acho que tornei o meu transgenerismo e homossexualidade meus inimigos por causa do Hugo. Neste último ano duvidei de mim como pessoa. Passei a sentir repulsa de mim mesmo. Chorei noites a fio, sozinho, em que só me apetecia morrer, sem ter ali ninguém que me consolasse. Passei momentos verdadeiramente penosos. Hoje sou uma pessoa fragilizada, assustada, mas com mais experiência e preparação. Não caio no mesmo erro outra vez. Mas isso também não iria acontecer porque será impossível eu apaixonar-me desta maneira por mais alguém. Eu não sei o futuro, ninguém sabe, mas mesmo que o Hugo desapareça da minha vida para sempre ele ao mesmo tempo será eterno. Eu nunca poderei apagar da minha memória aquilo que eu sinto por ele. Nem que eu viva 100 anos. É forte demais para esquecer. E eu quero guardar isso. Quero guardar o que restou de bom (principalmente os sonhos).
Eu sou um no meio de biliões neste planeta. Não quero que ninguém se preocupe comigo, que tenha pena ou que me ajude. Sinceramente não quero, por isso é que não chamo a atenção de ninguém, com atitudes tresloucadas. Por isso mesmo é que sofro em silêncio há mais de um ano. O que eu queria mesmo era que este rapaz me compreendesse, que me visse a chorar, que me estendesse a mão e dissesse que vai ficar tudo bem. Só ele. Na verdade, eu nunca lhe pedi nada em concreto. Nunca lhe pedi ajuda embora ele soubesse que eu estava a sofrer. Eu só implorei-lhe para ele não me fazer isto. Ele ignorou-me completamente. E eu não sei, honestamente, como suportei esta rejeição. Ele percebeu tudo ao contrário. Viu tudo do avesso. Viu a questão por uma perspectiva em que a sexualidade era o mais importante. Eu nunca quis pôr as convicções dele em causa. Eu, acima de tudo, procurei um amigo. E embora isso possa não fazer sentido era exactamente o que eu procurava, um simples amigo. Como somos tão diferentes pensei que a amizade pudesse resultar. Mas ele foi egoísta. E eu fui ingénuo. Ele nunca vai sentir compaixão por mim. Ele nunca vai voltar atrás. Ele nunca me vai aceitar. Perdi. Falhei em todos os aspectos. Não vale a pena eu chorar, espernear, gritar porque nada disso o vai fazer querer-me na vida dele e estar perto dele. A minha vida é uma treta sem sentido algum. Eu tenho feito um esforço sobre-humano na faculdade para ir concluindo as cadeiras em atraso e tenho tido êxito nisso, mesmo que as notas não sejam grande coisa. Acho que afinal consigo licenciar-me este ano, mas isso já não me interessa mais. Odeio o curso, odeio a faculdade, odeio tudo o que lá vivi, tudo o que lá sofri, tudo o que lá chorei. Maldita a hora que fui para ali estudar. Isto tudo tem me revoltado, embora eu mal reaja. Odeio-me, odeio a farsa em que me tornei, odeio a farsa que é a minha vida. Odeio a podridão à minha volta, odeio o preconceito, odeio a indiferença, odeio a intolerância. Não suporto mais nada nem ninguém. Estou sozinho na minha angústia. Estou a sofrer demais. É uma dor indescritível que só me faz querer desaparecer para eu parar de sofrer e não sentir mais isto. Estou em pedaços e preciso de me recompor. Quero chegar ao Hugo e contar-lhe tudo, abrir o jogo, apresentar-me. E vou fazê-lo. Em condições normais nunca o conseguiria fazer, mas com os comprimidos que vou tomar hei-de ficar cá e lá e assim vou conseguir superar este pânico que sinto e falar com ele. Se perdi, não tenho mais nada a perder. Prefiro que ele me odeie e que eu o odeie a ele, prefiro que discutamos, prefiro qualquer coisa a isto. Isto é o inferno e eu quero sair daqui. E se ele ler isto um dia então acho que ele vai entender-me finalmente, que tudo tem um limite e eu cheguei ao meu. A situação tornou-se insustentável. Não dá mais para fugir, para tentar esquecer, etc. Não dá para recuar nem dá para estar em cima do muro. Só dá para saltar e prosseguir. Nada resultou. E aquelas 1000 estrelas lá no céu, as minhas testemunhas nas inúmeras noites de angústia, vão acompanhar-me também nesta última jornada.

Curiosidade: a imagem acima, que faz alusão às "1000 estrelas", foi a imagem que utilizei no primeiro perfil fictício que criei para contactar o Hugo na rede social. Foi a imagem que simbolizou o início. Tem um valor incalculável para mim e é a minha preferida de sempre.

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